26/09/2014
A economia brasileira cresceu à média anual de 2,4% desde a década de 80 até o ano passado, mas a indústria não acompanhou o ritmo e foi ficando para trás. Se o Produto Interno Bruto (PIB) nacional avançou 128% de 1980 a 2013, o da indústria de transformação subiu menos da metade – 51%, ou 1,2% ao ano, no mesmo período. Esse descompasso fez com que o setor industrial chegasse ao fim de 2013 com uma participação de 13% no PIB nacional, o menor em 50 anos.
No primeiro semestre de 2014, essa participação recuou a 12%, segundo a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Para os empresários, o que estes números retratam é um intenso processo de desindustrialização que precisa começar a ser revertido com urgência, atacando de vez as frentes que compõem o Custo Brasil e o desequilíbrio cambial para que o desenvolvimento do país tenha sustentação no futuro.
“Não dá mais para a gente ficar improvisando. Precisamos de uma estratégia que seja capaz de mostrar, para a indústria, que vale a pena produzir no Brasil; para os bancos, que emprestar dinheiro para o setor produtivo é um bom negócio; para o consumidor, que ele pode adquirir bens porque o país vai continuar crescendo e criar empregos”, afirma José Ricardo Roriz Coelho, diretor-titular do departamento de competitividade e tecnologia (Decomtec) da Fiesp.
“É fundamental recuperar a confiança na política macroeconômica. Temos um país com grandes oportunidades, mas também um conjunto de amarras institucionais que provocam insegurança e inibem investimentos”, reforça José Augusto Fernandes, diretor de Políticas e Estratégia da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Em ano eleitoral com disputa acirrada para a Presidência da República, como indicam as pesquisas de intenção de voto, a cautela é ainda maior, mas também há a expectativa de que o Brasil entre em um novo ciclo tão logo sejam definidos os resultados das urnas. “Acreditamos que, terminadas as eleições, esta agenda passará a ser enfrentada, até porque todos os governos têm aquele ‘período de graça’, que é o início do mandato. Esperamos que, quem quer que seja eleito, aproveite este momento para dar continuidade ao processo de reforma institucional no país”, afirma Fernandes.
O processo, na visão dos representantes da indústria, necessariamente terá de envolver uma política macroeconômica que tenha entre seus objetivos o aumento da competitividade do setor. Conforme estudo da Fiesp, mesmo perdendo participação no PIB, a indústria responde por 30% da arrecadação nacional de impostos, o correspondente a uma carga tributária média de 59,8% do PIB industrial. “Para construir uma fábrica, temos que pagar impostos na compra de tijolo, cimento, ferro. Um terço da construção é imposto. É fundamental desonerar a instalação e melhoria das fábricas para que o país possa se desenvolver”, diz o presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs), Heitor José Müller.
Ele também cita as altas taxas de juros nos investimentos e seu efeito sobre o câmbio – que, supervalorizado, estimula as importações -, além dos encargos trabalhistas. “Em primeiro lugar, é preciso diminuir o custo de produção no Brasil, pois chegamos a um ponto em que não adianta aumentar a renda porque nossos produtos continuam caros”, argumenta Roriz.
Segundo a Fiesp, os produtos nacionais são, em média, 29,9% mais caros no mercado interno do que os similares de países desenvolvidos, 36,9% mais que os dos países emergentes e 32,3% acima dos concorrentes da China. “Com a expansão do mercado interno que tivemos recentemente, a indústria também passou a ter custos que não tinha, como o encarecimento da infraestrutura, que se tornou sobre-utilizada”, diz o professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), David Kupfer.
A desindustrialização é um dos reflexos do próprio crescimento econômico. Com o aumento da produtividade industrial reduzindo preços e a mudança de perfil de consumo da população em decorrência do aumento da renda – supridas as necessidades básicas de produtos e alimentação, as pessoas começam a demandar mais serviços, com os de lazer e cultura -, é natural que a participação da indústria no PIB diminua. “Acontece que este fenômeno surge depois que a renda per capita atinge uma faixa de US$ 20 mil, quando o país já tem um nível de escolaridade adequado e empregos de boa qualidade. Estamos longe disto. É uma desindustrialização precoce, causada por vários fatores”, diz Roriz.
De acordo com as lideranças empresariais, a reindustrialização requer medidas como a formulação de uma política industrial de longo prazo, uma taxa de câmbio competitiva, a eliminação da Selic na remuneração de títulos públicos, a simplificação do sistema tributário e a redução da carga tributária da indústria a níveis condizentes com sua participação no PIB, além de concessão de subsídios e maior volume de financiamento.
“Neste momento da nossa economia é a indústria que sustenta os melhores empregos e a oferta de produtos. Se não produzirmos aqui, nossa balança comercial vai para o espaço, pois vamos exportar produtos primários e importar os de melhor qualidade”, afirma Roriz. São problemas que devem demorar a ser resolvidos e é preciso pensar como conduzir a indústria até lá, na opinião de Kupfer. “A saída é criar condições para produzir menos variedades com maior valor agregado, competindo mais em diferenciação de produto e menos em custo, pois isto nós já perdemos para o sistema asiático de produção.”